Sobre o Cine


A CONTRIBUIÇÃO DO NEGRO PARA A ECONOMIA BRASILEIRA

Filme: Mãos e Cérebros Negros


O último Cine teve como objeto de discussão o documentário Mãos e cérebros negros, (Dir. Daniel Caetano) no qual, historiadores trazem à baila a colaboração do negro na vida econômica do país. A obra mostra a participação dos negros na arte, na decoração de igrejas, na confecção de peças de ferro e bronze, na lavoura, nos serviços domésticos e no comércio.
O documentário se caracteriza por mostrar informações que são desconhecidas pela maioria das pessoas, como as intervenções da Igreja, a pedido dos senhores de escravos, para conter as revoltas e fugas. Uma destas situações fica clara no sermão do padre Antônio Vieira, em que ele chama os escravos à submissão seguindo o exemplo do Cristo e compara o sofrimento a que são submetidos os negros ao calvário ou sujeição do chamado filho de Deus. O sermão do padre, baseado em sua religião e sua lógica em relação ao sofrimento, em uma de suas orações diz: “Não ha trabalho, nem gênero de vida no mundo mais parecido á Cruz e Paixão de Cristo, que o vosso em um d’estes engenhos”; tentando mostrar que a escravidão, para os escravos, deveria se de resignação, ao que parece, sua crença de purificação através da submissão e resignação frente a seu destino;
Apesar de Vieira ser considerado por historiadores como abolicionista, em várias ocasiões demonstra ser contra o tráfico de escravos, sua função religiosa às vezes colocava seus discursos em contradição com suas ideias de abolição, “Bem-aventurados vós se soubéreis conhecer a fortuna do vosso estado, e com a conformidade e imitação de tão alta e divina semelhança aproveitar e santificar o trabalho!”.
O documentário Mãos e cérebros negros ressalta a força negra como pilar da economia brasileira, Mão de obra presente em todos os setores produtivos da economia brasileira. Nas lavouras, nos serviços domésticos e urbanos, na mineração e no comércio.  O reconhecimento da mão de obra negra no processo civilizatório no Brasil, no entanto, não é efetivado. Ao instalar-se o capitalismo a força negra é suplantada por outras e em nenhum momento há um esforço de inclusão de sua força produtiva no sistema assalariado.
Podemos distinguir o trabalho escravo em três tipologias: o produtivo – trabalha nas lavouras e minas; o doméstico - trabalhava na casa dos senhores, eram cozinheiros, amas, lavadeiras, costureiras, e mucamas; e o urbano – escravos de ganho e de aluguel - os de ganho iam pelas ruas prestando serviços ocasionais e no final do dia prestavam conta ao senhor de uma quantia fixada. Nesse caso o senhor não tinha nenhuma obrigação às necessidades do escravo, pois se considerava que ele dispunha de maior liberdade e tempo para prover-se. Os de aluguel realizavam alguma atividade com propriedade e eram alugados por seu senhor a terceiros – sapateiros, carpinteiros, cozinheiros, pintores, arquitetos e outros.
O foco do debate do documentário veio no sentido de olhar para as questões relacionadas aos escravos que se sobressaiam como artistas, tendo uma vida diferenciada dos que estavam em campo e outros que demonstravam grande qualificação nos seus ofícios. Também foi debatida a relação entre o mérito da qualificação e o mérito religioso usado na manipulação dos negros para que a submissão fosse vista como mais amena.

Texto: Ailton Amaral




NEM TODAS MENINAS PODIAM SER PAQUITAS!  
“Cores & Botas” discute os padrões estéticos estabelecidos pela mídia
A cineasta Juliana Vicente

No último dia 10 de março de 2012 realizamos o 22º Cine Palmarino e tivemos o prazer de exibir o curta-metragem “Cores & Botas” da cineasta Juliana Vicente. Aliás, ela esteve presente e abrilhantou nosso debate. O filme é resultado da conclusão do curso de cinema e foi um dos três escolhidos pela faculdade para co-produção. Considerando que as instituições brasileiras, sobretudo as mais conservadoras, resistem a temas de cunho racial, Cores & Botas encontrou uma brecha para disseminar o debate sobre a identidade negra e a discriminação no espaço escolar.
A história de uma menina negra que sonha em ser paquita  “não é autobiográfica” segundo Juliana, mas confessa que se identifica com Joana (Jhenyfer Lauren), a personagem principal, pois quando criança também teve o desejo de ser paquita. Eis ai o fio condutor do debate: por mais que se esforce o que impede Joana de realizar seu sonho não está ligado a sua determinação e sim ao fato de ela entrar em desacordo com o padrão estético que caracterizam as Paquitas, assistentes de palco da apresentadora Xuxa Meneguel, sucesso na década de 80. O argumento que muitas pessoas sustentam de que o preconceito é mais social que racial cai por terra quando se percebe que, mesmo vindo de uma família bem-sucedida economicamente, “querer” nesse caso não é “poder” já que os critérios de escolha das Paquitas eram primordialmente baseados na eugenia: garotas brancas, preferencialmente loiras de olhos claros, sem traços de mestiçagem aparentes. A imagem da menina negra não reflete no “espelho branco da sociedade brasileira”.
Em se tratando de um tema delicado como o racismo, Juliana falou um pouco da sua preocupação no preparo com as crianças do elenco já que a trama é ambientada no espaço escolar. Lidar com o tema racial com crianças requer atenção, pois geralmente é na tenra idade que o contato com um racismo “sem filtro” é absorvido de uma sociedade que se nega racista. Juliana se disse contente pelo fato não ter havido problemas nem com os pais tampouco com as pequenas atrizes.
O desfecho do curta é lúdico, não pessimista, pelo contrário, aponta para novas perspectivas para Joana, sem traumas ou frustrações. Também dá um contraponto interessante ao discurso do preconceito social predominar sobre o preconceito de raça ao mostrar o conflito vivido por parte da classe média negra que, apesar de acreditar no discurso de que o esforço individual para superação das desigualdades de raça, ainda tem sua ascensão social limitada pela cor da sua pele. O papel da escola na reprodução do preconceito (e da importância dela para dissolução do mesmo) é outro ponto abordado excelentemente pelo filme.
A contribuição do público foi muito importante para o amadurecimento e o aprofundamento de algumas questões como, por exemplo, o impacto da mídia na auto-imagem, principalmente na estética de garotas e mulheres negras.
Cores & Botas contribui para o avanço de um debate racial franco, direto, muito bem produzido por uma cineasta promissora que desponta no cenário paulistano. Ao final, inauguramos uma nova fase do Cine Palmarino, num novo espaço (Ação Educativa) e com novas ideias, abrindo o ano de 2012 com  muito Axé. Agradecemos a todas e todos presentes e até o próximo Cine!



Texto: Renato Adriano Rosa
 
EU, TU, ELAS CAROLINAM...



Na 21º edição do Cine Palmarino em novembro de 2011 exibimos pela segunda vez o curta-metragem “Carolina” inspirado nas confidencias de Carolina Maria de Jesus publicadas no livro “Quarto de Despejo”(1960). A primeira oportunidade foi em agosto de 2010 no aniversário de 1 ano do Cine e, devido ao festejo que se seguiu, apenas margeamos a personagem por de trás do curta-metragem. O fenômeno que possibilitou, em meados da década de 60, que uma mulher negra, mãe solteira, catadora de papel se tornasse escritora merecia maior enfoque de nossa parte. E não havia melhor ocasião de retomar a memória da personagem e de sua obra do que junto a um projeto que conjuga seu nome: “Carolineando”. Em parceria com a entidade Afroeducação, responsável pelo projeto, fizemos no último dia 26 de novembro de 2011 a exibição do curta-metragem Carolina do cineasta Jeferson De, junto à exposição fotográfica “Carolinas” de Diego Balbino, seguido do Recital Corações em Punga.
Após a exibição, a escritora Paola Prandini e Cíntia Gomes, idealizadoras do Afroeducação, embalaram nossa roda de conversa contextualizando a figura homenageada. A troca de ideias vinda do bate-papo possibilitou o amadurecimento de alguns aspectos sobre a importância da obra dessa representante das classes populares no mundo literário e o significado do seu legado.
Num país como o Brasil onde o racismo é negado em prol de uma suposta “harmonia” e “igualdade” entre as raças, entretanto a prática social do racismo é uma constante realidade, discutir a ascensão meteórica de Carolina não é simplesmente falar sobre a história particular de uma mulher negra que vence pelo seu talento individual.
Antes de tudo, significa compreender como e quais são as brechas por onde negros e negras saem do espaço simbólico reservado a eles (o carnaval, o futebol, a dança, a culinária, etc.) e penetram nos espaços simbólicos de segregação racial dominado por uma elite branca como, nesse caso, o universo literário.
Muitos apontam que Carolina, enquanto escritora, foi fruto do mero acaso ao ter sido descoberta pelo jornalista Audálio Dantas, figura que a projetou no mercado editorial após entrevistá-la na favela do Canindé. Essa relação “paternalista” (e conflituosa) com Dantas, segundo alguns, foi o que lhe abriu as portas. Outros apostam que foi o interesse numa realidade “pitoresca” descrita de maneira confidencial no seu primeiro livro-diário que aguçou a curiosidade da classe média brasileira, e posteriormente, a de outras partes do mundo. Mesmo vista como uma escritora “exótica” por não se enquadrar nos padrões da norma culta, tampouco comungar dos mesmos valores e origem dos escritores da elite social, Carolina Maria de Jesus driblou as adversidades da pobreza e tomou de assalto o campo das letras expressando criticamente a política da época, o preconceito racial e social, denunciando a miséria e a fome.
Mesmo com a polêmica acerca de supostas intervenções a sua obra pelo seu tutor Audálio Dantas, Carolina não teve a sua importância diminuída. Pelo contrário, hoje é resgatada nos diversos saraus das periferias urbanas e reivindicada como uma das precursoras do que alguns chamam de “literatura marginal”, ou seja, uma literatura feita por escritores originários de classes marginalizadas (leia-se pobres, negros(as) e proletários) que reflete os valores, o linguajar e a realidade social das áreas pobres das grandes cidades. Ela é uma das referências de uma geração de escritoras(es) igualmente marginalizadas(os) que “ousam” desfilar seus escritos sem pedir licença aos cânones.
Prova disso são os versos sagazes das poesias de Elizandra Souza e Akins Kinte, que acompanhados da percussão contagiante de Daniel Alves e Nego Jô, e pelos movimentos magníficos da dança afro de Ana Paula Gomes, exibiram o recital Corações em Punga, espetáculo que celebra a ancestralidade afrodescendente e a contemporaneidade da arte periférica.
A exposição de fotos de Diego Balbino revelou que a realidade de pobreza de uma catadora de papel num depósito de lixo vivida e descrita por Carolina em seu livro-diário Quarto de Despejo, ainda é um fato no Brasil de hoje, cinqüenta anos depois da primeira edição desse livro.  As fotografias de mulheres trabalhadoras de um depósito de recicláveis revelaram, segundo Diego, as “Carolinas” de hoje.
Ao final do recital, a nossa confraternização de praxe celebrando o encerramento de mais um ano de sucesso do Cine Palmarino.  Agradecemos por essa fantástica edição do Cine à Paola Prandini, Cíntia Gomes,  Diego Balbino, Elizandra Souza, Akins Kinte, Daniel Alves, Nego Jô, Ana Paula Gomes. Agradecemos por mais um ano de Cine a nossa parceira ACM, nas figuras das amigas Nelci, Conçeição e do Seu Moacir.
Por fim, mas não menos importante, saudamos com um grande AXÉ a todas e todos que participaram e nos apoiaram em nossa atividade. O Cine Palmarino é uma ação coletiva, por isso a participação de todos é a nossa razão de existir. Seguiremos no próximo ano discutindo as possibilidades de uma sociedade mais igualitária e justa.
Assé!

Texto: Renato Adriano Rosa.



CONHEÇA A OBRA DE CAROLINA MARIA DE JESUS
  • Quarto de despejo: diário de uma favelada (1960)
  • Casa de alvenaria (1961)
  • Provérbios (1963)
  • Pedaços da fome (1963)

Carolina falece em 1977 deixando uma obra póstuma:
  • Diário de Bitita (1986)
  • Antologia pessoal (1996) e Meu estranho diário (1996) foram escritos de Carolina organizados e editados por José Carlos Sebe Bom Meihy.

PARA SABER MAIS SOBRE CAROLINA LEIA:
  • Os Fios dos desafios: o retrato de Carolina Maria de Jesus no tempo presente. Artigo de José Carlos Sebe Bom Meihy publicado no livro Memória Afro-Brasileira, volume 2: Artes do corpo. Organização Vagner Gonçalves da Silva, editora Selo Negro, 2004.
  • Cinderela negra: a Saga de Carolina Maria de Jesus de José Carlos Sebe Bom Meihy & Robert M Levine,editora da UFRJ, 1994. 




JENNIFER: MENINA NEGRA, "ESPELHO BRANCO" 
Bate papo com o diretor Renato Cândido e o ator André Luis Patricio

Cineasta Renato Cândido.
No 20º Cine Palmarino debatemos o média-metragem “Jennifer” com a presença do seu diretor e roteirista, Renato Cândido e de um dos atores do elenco, André Luís Patricio.

Renato contextualizou a obra dizendo que a história trata da formação identitária e da auto-estima de uma adolescente negra residente da periferia da cidade de São Paulo.

A questão racial está posta no conflito a partir do momento que Jennifer transforma suas fotos editando as imagens no computador para se sentir mais bonita.
Nessa manipulação da própria imagem, Jennifer tenta se aproximar de um referencial de beleza que o autor chama de “espelho branco da sociedade brasileira”, ou seja, um padrão estético valorizado a medida que se aproxima das características físicas dos eurodescendentes.

O conflito identitário emerge quando Jennifer busca a aceitação dentro do seu grupo social (especialmente dos garotos!) deixando seus cabelos menos crespo e “armado” e mais liso.

Jennifer causou identificações em mulheres que na fase da adolescência também tinham no espelho branco um referencial que não as refletiam, pelo contrário, as rejeitavam pela insígnia do “cabelo ruim”! Transformar a imagem para ser vista ou aceita no seu meio social é bastante comum numa fase de transição tão peculiar como a adolescência. Daí a identificação com Jennifer não ser tão rara para parte dos expectadores.

Mesmo tendo a pele mais clara, a protagonista ostenta traços inegáveis de sua afrodescendecia caracterizados na face e nos cabelos. Aliás, durante a roda de conversa a questão sobre a "negritude" veio a baila principalmente por Jennifer ser mestiça (mãe negra e pai branco). A pele clara de Jennifer, mesmo com traços que revelam sua ascendência, possibilitava, na opinião de uma das participantes da nossa roda de conversa, uma via de “negociação” com esse “espelho branco” já que no Brasil o preconceito racial é um preconceito de marca que estigmatiza muito mais os que se distanciam do fenótipo considerado padrão estético de beleza (o eurodescendente!).
Ator André Luis Patricio

O ator André Luís Patricio (que faz o papel de gerente do supermercado onde Jennifer procura emprego) diz o quanto isso interfere na carreira dos atores negros já que quanto mais marcas da ancestralidade negra portarem, menores são as ofertas de trabalho e mais estereotipadas são as personagens. “Só me chamam pra fazer papel de bandido!” revela o ator que, na grande maioria das vezes é chamado para papéis que sempre retratam o jovem negro numa condição marginal. Nesse caso, Jennifer possibilitou a André encenar um cidadão negro comum, do cotidiano, fora dos estereótipos que a mídia branca impinge aos atores e atrizes negras. Lázaro Ramos e Thais Araujo são exceções enquanto André reflete a regra da maioria dos profissionais negros de dramaturgia.

Em meio ao debate, elogios a qualidade técnica, a sensibilidade e ao cuidado que Renato Candido e o elenco doaram a obra. Aliás, Renato demonstrou ter uma grande vocação para sétima arte e muita habilidade no seu discurso, sobretudo no que se refere a complexidade da questão etnicorracial do nosso país. Revelou projetos futuros e tem tudo para, daqui a algum tempo, despontar como nome de peso no cinema brasileiro.
“Jennifer é o primeiro de muitos que estão por vir”, afirma o diretor! Só resta aguardar as próximas obras e desejar vida longa a esse primeiro trabalho de Renato.

TEXTO: RENATO ADRIANO ROSA
A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE A PARTIR DA RAÇA E DO GÊNERO
 
No último Cine Palmarino o debate foi acirrado. Contamos com a presença de Renato Cândido, diretor do Média Metragem Jennifer, e do ator André Luis Patricio, um dos personagens do filme, para contextualizar o processo criativo e situá-lo dentro da falsa realidade da democracia racial do Brasil.
Renato apontou a problemática central que é a construção da identidade dentro de parâmetros pré-estabelecidos numa sociedade racista. A personagem central, Jennifer, é uma adolescente com raízes africanas e fruto da mestiçagem, em busca de um emprego e atordoada com conflitos internos entre assumir e valorizar ou não as suas origens.
O diretor apontou de inicio as relações com o espelho branco que todos nós travamos diariamente e provocou o público ao questionar como uma adolescente “branca” pode dialogar com o público negro. A personagem também suscitou a questão do duplo preconceito sofrido pela mulher - o gênero e a cor.
Os participantes do debate afirmaram que há na obra uma tensão constante e tênue entre o mito da democracia racial e a construção de uma sociedade multiétnica.
A contribuição do ator André Patricio também foi enriquecedora ao comparar o filme Jennifer com outras obras que buscam explorar a mesma temática. André relatou sua vivência enquanto ator negro em um espaço midiático que pressupõe o lugar do branco e do negro. Foi enfático ao falar o que infelizmente comprovamos diariamente - “é muito difícil ser ator negro no Brasil”, desabafou o ator.
Nos aspectos técnicos, Jennifer, a periferia viva dialogando com nossos sentimentos transparece o amadurecimento do esforço da cultura subalterna nas produções artísticas. O profissionalismo permeia o trabalho de Renato Cândido, que promete continuar oferecendo ainda mais complexidade nos próximos filmes.  Aguardem!

Texto: Rita Silva.

MATÉRIA SOBRE O CINE PALMARINO NO SITE "CATRACA LIVRE"


Cine Palmarino trata questão racial através da Sétima Arte

André Nicolau em 24/08/11

FONTE:  http://catracalivre.folha.uol.com.br/2011/08/cine-palmarino-3/

Projeto cultural estimula discussão sobre a imagem do negro na sociedade brasileira

Mais de 100 anos se passaram desde o simbólico 13 de maio de 1888, que apesar de propor o fim da escravidão sofrida pelos negros em terras tupiniquins, sequer cumpriu seu papel inicial: o de livrar o homem afrodescendente das correntes que ainda hoje o segrega diante da sociedade. E se a luta por respeito, liberdade e igualdade continua, ela segue muito bem representada através da Sétima Arte, com o projeto CINE PALMARINO que há dois anos desenvolve uma série de ações sócio-culturais no bairro do Jabaquara, zona sul da capital.Organizado por um núcleo do movimento negro Círculo Palmarino, o projeto realiza sessões gratuitas com apresentação de documentários e curtas-metragens que exaltam os diversos valores da cultura afrobrasileira.“Usamos a linguagem do cinema para tentar despertar o debate sobre a questão racial, estimulando indagações e questionamentos entre os participantes”, ressalta Luciete Silva, coordenadora estadual do movimento.Desde a invenção dos irmãos Lumiére, na charmosa Paris de 1895, a “Sétima Arte” tomou diferentes formas, estéticas e trajetórias ao passar dos anos, com aspectos de revolução na Rússia de Sergei Eisenstein e de contestação social em países como França, Itália e Brasil. No mesmo caminho de transformação, o Cinepalmarino busca  atingir seus objetivos. “Recebemos de 30 a 60 pessoas por sessão. Se conseguirmos passar a mensagem para este grupo, estamos fazendo a nossa parte” exalta.Entre os diversos títulos apresentados pelo projeto, destacam-se os trabalhos de novos nomes da produção cinematográfica nacional, como Wagner Soares, Mariana Monteiro, Jeferson De e Alessandro Buzo. Além da participação de professores, jornalistas, diretores, representantes de movimentos sociais e coletivos culturais presentes nos debates realizados após as exibições.“Se a nossa proposta é estimular a conscientização da comunidade, precisamos reunir pessoas que tenham o mesmo objetivo”, finaliza.

TEXTO: André Nicolau | CATRACA LIVRE

A magia, solidariedade e pertencimento do futebol de várzea ainda existem? 
O documentário Várzea: a bola rodada na beira do coração, filme de Akins Kinte, exibido no 19º Cine Palmarino em 17 de setembro rendeu um bom bate papo com os assíduos participantes. Os principais elementos abordados durante o debate foram: a institucionalização do futebol; as relações entre mídia e futebol; o futebol como elemento aglutinador e de pertencimento da comunidade e a inserção das mulheres nesse esporte.
A conversa partiu da breve exposição do professor de Filosofia da Faculdade Cásper Libero, Francisco José Nunes. Nunes apontou o futebol como elemento de manutenção da ordem social vigente, no inicio do século XX, uma vez que nos seus primórdios foi utilizado nas fábricas, para incutir noções de regras, marketing, hierarquia e controle dos negros, egressos do regime escravocrata.
Em seguida, a conversa foi enriquecida com os comentários sobre como a mídia mostra os jogadores de futebol e como os próprios se reconhecem enquanto negros discriminados dentro do campo de futebol, recebendo bananas e reforçando os estereótipos; Chegou - se a um consenso que não há debate sobre o assunto no meio esportivo e muito menos na mídia.
Em contrapartida, o documentário abriu uma janela ao demonstrar a presença feminina, organizando e reunindo a moçada para o futebol de várzea, aquele futebol pacífico que gera pertencimento e afeto entre as pessoas. Aquele futebol que levou o craque Cafu a levantar a camisa e mostrar seu recado: 100% Jardim Irene.
Para LER...
- O Negro no futebol brasileiro – Mario Filho. Ed. MAUAD, 2003 
- Futebol – espetáculo do século. Ed. MUSA, 1999
Para REFLETIR...
- Os negros são ótimos jogadores de futebol, mas você conhece algum técnico negro?
- O futebol tal qual o conhecemos hoje tem alguma relação com o lindo esporte praticado nos campos dos bairros ou é apenas mais um golpe do capitalismo que insiste em destacar os selecionados e condenar os “piores e incapazes” à invisibilidade?
- O futebol hoje é visto como fuga da pobreza e não como meio de educação para a consciência do pertencimento de classe. 

Texto: Rita Silva.

NEGRAS VOZES, BELAS IMAGENS E SÁBIAS PALAVRAS NO 2º ANIVERSÁRIO DO CINE PALMARINO
Sr. Liberto Trindade - Filho de Solano Trindade
No dia 20 de agosto, o Cine Palmarino comemorou o 2º ano de luta pela conscientização da presença desigual da comunidade afro- brasileira no Brasil. O evento foi marcado pela exibição do documentário Solano Trindade 100 anos e pela presença de Liberto Trindade e os grupos Sarau Palmarino, Sarau da Ademar e Fórum de Hip Hop de São Bernardo que recitaram os poemas do grande poeta.

A exibição do documentário Solano Trindade 100 anos, dirigido por Alessandro Guedes e Helder Vieira, que retrata a vida do poeta do povo, deixou no ar um sabor de quero mais. Repleto de depoimento de amigos, admiradores e familiares, além de recitações das principais obras, a narrativa mostrou-se emocionante; ficou, portanto, lançado o desejo de conhecer um pouco mais a obra e vida de Solano.
Após, o encontro foi enriquecido com o depoimento de Liberto Trindade, filho de Solano. Ele ressaltou o caráter itinerante e político do seu pai, e junto a tudo isso, o orgulho de ser seu filho. “Ser  filho de um buscador me orgulha muito. Prefiro chamá-lo de Solano e não de papai, pelas grandes contribuições à esperança de um Brasil maior”, afirma Liberto.
Em clima de festa, os integrantes do Sarau Palmarino, Sarau da Ademar e Fórum de Hip Hop de São Bernardo recitaram obras de Solano e também releituras e produções próprias. Como esperado, no repertório constou Tem gente com fome e mulher barriguda.
Mais uma vez, ao longo de dois anos, o Cine Palmarino demonstrou ser o Quilombo da resistência, espaço de aglutinação e debate de uma das causas mais importantes da sociedade brasileira.
Oxalá! Seja este o 2º de muitos anos de contribuições e festejos.


O MUNDO GLOBALIZADO NA VISÃO DO INTELECTUAL NEGRO MILTON SANTOS  
Bate papo com Prof. Dennis de Oliveira sobre o legado do pensamento de Milton Santos 

Professor Dennis de Oliveira
Dia 19 de maio o Cine Palmarino mais uma vez contribuiu com o debate polêmico e inconcluso das contradições geradas pela globalização a partir da exibição do documentário Encontro com Milton Santos ou: o lado global do lado de cá e as provocações do professor Dennis de oliveira, jornalista e coordenador do CELLAC (Centro de Estudo Latino Americanos de Cultura e Comunicação).
Mesmo com a visão esperançosa do grande intelectual Milton Santos ao apontar para a possibilidade de outra globalização forçada pela periferia, os participantes do último Cine conversaram sobre a realidade opressora na qual estão inseridos e que muitas vezes parece estagnada, considerando que os mesmos elementos apontados no documentário parecem ter se potencializado nos últimos anos.
Dentre os assuntos discutidos merecem destaque os questionamentos sobre a concentração brutal de tecnologia nos países centrais do capitalismo, o modelo de consumo totalmente insustentável, a incapacidade de inclusão do capitalismo, a insatisfação das massas que cada dia mais vem se posicionando em prol de uma vida mais justa e a democracia de fachada que estabelece o poder de alguns grupos. 

Trocando idéias com Guilherme Botelho sobre  "Nos tempos da São Bento"
Guilherme Botelho
Não era certa a presença do diretor do documentário "Nos Tempos da São Bento" no nosso recinto no último dia 14 de maio, data em que exibimos o vídeo. Próximo ao final da exibição fomos saudados com a ilustre presença de Guilherme Botelho, diretor do doc que enriqueceu o debate sobre o tema exibido,ainda pouco conhecido fora dos limiares do movimento Hip Hop. Guilherme integrou a última geração de  dançarinos de breack do Largo São Bento, local situado na zona central da cidade de São Paulo e um importante palco do  movimento Hip Hop, movimento este que ganhou impulso na segunda metade da década de 80. O que motivou a obra foi, segundo o autor, a saudade de um tempo que marcou a sua vida e de tantos outros que participaram dos encontros na São Bento para pura e simplesmente dançar, trocar idéias e curtir aquele momento. Embora não tenha requintes técnicos apurados (dada as limitações de recurso de uma produção praticamente independente) o documentário ganha na sua estrutura, tendo a memória como mote e os depoimentos como fios que tecem a colcha do tempo reconstruído a partir dos relatos. Guillerme, além de muito gente boa, tem uma ótima formação em História (fez História na PUC). 
Sem planejar, realizamos uma das melhores sessões do Cine Palmarino! Mais uma peça que nos prega o acaso...

Jeferson De visita Cine Palmarino
Exibição do trailer do filme Brother! e bate papo marcaram o 15º Cine Palmarino


Cineasta Jeferson De
Uma conversa entre amigos, assim foi o 15º Cine Palmarino realizado no Núcleo Jabaquara no último sábado. Os participantes puderam pensar e discutir a realidade dos negros na mídia a partir da exibição do trailer do longa metragemBrother! , em seguida houve um bate-papo.
Com data marcada para exibição no Brasil, Brother! o novo filme de Jeferson De, relata a história de três amigos que foram criados no Capão Redondo – SP e se reencontram após alguns anos em meio a tensões pessoais e sociais. O primeiro longa metragem de Jeferson já obteve várias premiações: melhor filme no Festival de Gramado e de Paulínia, ambos em 2010. A estréia está prevista para o dia 21 de abril, o filme será rodado nacionalmente em parceria com a Globo Filmes e distribuição da Columbia/Sony.
Jeferson já é um antigo conhecido do Cine Palmarino, seus curtasCarolinaNarciso Rap e Distraída para a morte já foram exibidos em 2010, por isso, no último encontro, sua presença foi aproveitada ao máximo. Perguntas e comentários relevantes trouxeram à tona a história pessoal, o trabalho do diretor e de forma geral as principais questões do discurso racial no Brasil.
Questionado sobre a relação etnia X raça na televisão brasileira, o cineasta ressaltou a importância da atuação negra em outros segmentos. “Mais importante que ter um negro como ator, é ter um roteirista ou diretor”; Jeferson explicou sua afirmativa apontando a limitação do ator, que deve fazer o que está escrito.
Em seus longos e extrovertidos comentários afirmou ainda que “ser negro ou não ser negro é uma questão que não pode ser medida pela cor da pele, mas pelas medidas de exclusão que os indivíduos da periferia são submetidos, uma vez que na favela todos são considerados iguais pelo sistema capitalista”, acentua o diretor.
O debate estava empolgante, o horário limite da discussão foi ultrapassado e muitas questões não foram aprofundadas, no entanto, quem esteve presente na 15ª edição do Cine Palmarino saiu enriquecido não só pela qualidade do discurso, mas também pela experiência pessoal do cineasta, um dos poucos negros que atuam diretamente na sétima arte.
De forma geral foi apontada a baixa participação do negro na mídia e conseqüentemente a manutenção do preconceito e estereótipos, além da queda na qualidade dos empregos oferecidos.
Os participantes expressaram a alegria não só pela presença de Jeferson, mas pela sua contribuição como pessoa, como profissional competente e como irmão na luta pela conscientização racial



Cidade das Mulheres
14º Cine Palmarino - Debate sobre a Mulher Negra e Comemoração de 5 anos da corrente do movimento Negro Círculo Palmarino.
Recheado de simbolismo por ser o 1º Núcleo do Círculo Palmarino, a militância do jabaquara realizou no dia 12 de março, data que marca os 5 anos da corrente do Moviemnto Negro, o Cine Palmarino apresentou o Documentário "A Cidade Das Mulheres" de Lázaro Faria. O auditório da ACM CDC Leide das Neves ficou pequeno para as quase 70 pessoas que compareceram a atividade.
Após a exibição do vídeo, Juninho da coordenação nacional do Círculo Palmarino, foi convidado para fazer uma fala sobre os 5 anos da entidade onde destacou: " É uma curta mas intensa construção herdada pelos nossos ancestrais que a 500 anos lutam por uma sociedade mais justa neste país. São 5 anos de Luta e 500 anos de Resistência!".
Na sequência Luciete, coordenadora do núcleo Jabaquara, fez uma reflexão sobre o dia internacional das mulheres destacando em especial a condição da mulher negra que está na base da pirâmide social.
Logo após um grande círculo foi formado e, sob a coordenação de Chico Nunes, deu-se início a um excelente debate sobre o documentário exibido.
O Cine Palmarino agradece a realização dessa 14º edição ao apoio da cineasta Lilian Santiago que viabilizou a exibição do documentário "Cidade das Mulheres". A ela nosso muito obrigado!